terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Not Afraid

Aquilo nas minhas mãos era sangue... Sangue!
Logo uma tonteira me fez cair, e tudo se apagou.
Acordei lentamente, como se ainda não tivesse acordado. Vi dois rostos próximos do meu, como se estivessem me esperando. Um era pálido, possuía olhos semelhantes a ônix, cabelos lisos um pouco ondulados e negros, curtos, só que mais compridos na frente para deixar poucas mechas na testa.
O outro era mais amorenado, olhos cor de chocolate, cabelos castanhos que se formavam em belos cachos nem grossos nem finos, estes caíam-lhe sobre os olhos. Ambos eram crianças de aparentemente 7 anos.
Sentei e os fitei. O de cabelos negros usava roupas inteiramente pretas. O amorenado usava calça jeans escura, camisa preta e tênis vermelho.
- Quem são vocês? - perguntei.
- Eu sou Ben. E esse é o Diogo. - respondeu o "gótico". - E você?
- Zero... Sued...
- Parece perdido. Não é daqui, né? - indagou Diogo.
- Acho que não... - falei, tentando levantar. Eles fizeram o mesmo.
Foi então que percebi. Minha estatura não estava como devia estar. Eu com certeza diminuí. Olhei para as minhas mãos, pareciam encolhidas.
- Alguém tem um espelho? - perguntei. Minha voz soava infantil, como aqueles seres que me faziam companhia.
- Eu tenho. - Ben tirou um espelho do casaco que usava.
Quase caí para trás, minha aparência era a mesma da de 8 anos atrás... Eu tenho certeza que fiz 15 ano passado... Acho que ainda não acordei.
Devolvi o espelho e olhei em volta: era um campo.
A grama alcançava meu tornozelo e o céu era de um azul bem vivo, o sol estava baixo.
- Venha conosco! Vamos pegar nossos bichos de estimação com o Palhaço Pedro.
- Opa, opa, eu não gosto de palhaços, não gosto mesmo. - ditei, tendo calafrios.
- Não tem problema, Pedro é bom e adora crianças. Ele é dono do pet shop. - argumentou Ben, sorrindo.
- Qualquer coisa saímos correndo. - ajudou Diogo, sorrindo da mesma maneira.
- Tudo bem. - suspirei. Eles conseguiam me passar segurança.
Seguimos por um caminho de terra até um pequeno estabelecimento. O ar cheirava a orvalho. Pela vitrine pude ver o palhaço anotar algumas coisas num bloco de notas. Diogo e Ben perceberam minha hesitação e puseram-se ao meu lado (Ben do esquerdo, Diogo do direito).
Entramos na loja e o palhaço olhou para nós.
- Ben, Diogo! Quem é seu amiguinho?
- Zero Sued. - respondeu Diogo, animado. - Onde estão?
- Aqui. - o palhaço pegou uma cobra preta e um pássaro vermelho de trás do balcão. Deu a cobra a Ben e o pássaro a Diogo. Ele me olhou bem e me entregou um coelho branco. - Você parece muito nervoso, Zero. - sorriu bondosamente. - Acho que o coelho combina com o senhor.
- Ah... Obrigado! - tentei retribuir o sorriso, mas este saiu torto demais para ser natural.
A cobra havia se enroscado na cintura de Ben, e o pássaro se mantia em pé no ombro de Diogo.
Nos viramos para ir embora, quando um outro palhaço, desta vez com aparência ameaçadora (peruca vermelha e dentes de tubarão), adentrou a loja com uma cesta coberta com um pano branco na mão.
Meus novos amigos prosseguiram e eu não quis ficar para trás. Quando nos aproximamos o bastante, o palhaço nos cumprimentou com um sorriso horrível, mostrava seus dentes amarelados de tubarão ameaçadoramente.
- Olá, crianças. - disse, com uma voz analasada. - Peguem, por favor. - tirou três pirulitos da cesta e nos entregando.
Fiquei com um vermelho, Diogo com verde e Ben com um azul. Agradecemos em coro e saímos da loja.
Afinal, palhaços não eram tão ruins assim... E o pirulito estava muito bom.
- Está escurecendo... - comentei, olhando para o céu.
- Hora de ir para casa. - disse Ben. - Aqui fica totalmente escuro à noite, uma cegueira. Por sorte, sabemos o caminho de casa sem nem mesmo precisar da visão.
No caminho terminamos os pirulitos e o céu já estava acizentado, e eu... Gradualmente ficando com medo.
- Podemos nos apressar? - indaguei, tremendo a voz sem querer. Coloquei meu coelho dentro da blusa. - O céu muda de cor muito rápido...
Os dois me deram as mãos, um de cada lado.
- Zero, a partir de agora você não vai enxergar nada devido a chegada da noite sem lua, então não solte nossa mão. E se soltar, guie-se pela nossa voz. Não vamos parar de cantar. - disse Diogo. - Acima de tudo, a escuridão não vai conseguir te machucar.
- Certo. - respondi, amedrontado, mas determinado. Aquelas duas pessoinhas me passavam uma imensa segurança.
E realmente não consegui enxergar mais nada: o breu tomava conta dos meus sentidos.
- Se essa rua, se essa rua fosse minha... - começaram a cantar uma música infantil. Pareciam anjos cantando. Relaxei e andei junto deles.
A escuridão parecia tão indefesa com eles por perto que poderia dançar... Não, seria inapropriado no momento.
Após curvas e caminhos diretos, topamos com uma grande casa. As luzes eram muito brilhantes.
- Chegamos. - disse Diogo.
Atravessamos o portão e entramos. Já sentia o aconchego. Tirei meu coelho do casaco e o olhei bem, era lindo e gordo. Aninhei-o no colo.
- Muito obrigado, acho que ninguém nunca foi tão bom comigo. - falei aos dois, que soltavam seus animais pela casa.
- Que isso, Zero-chan. - Ben deu tapinhas em meu ombro.
- Lembre-se: Sempre estaremos com você. Nunca deixará de ser nosso amigo. - completou Diogo.
- Nunca me esquecerei de vocês. - ditei, com os olhos úmidos. - Mas agora estou com sono...
- Você pode dormir no meu quarto. Suba as escadas e verá meu nome na primeira porta à direita.
- Ok. Boa noite.
- Boa noite. - responderam em coro.
Subi as escadas e entrei no quarto de Diogo. Logo caí na cama macia e adormeci.
Acordei abrindo lentamente os olhos. Ali percebi que não era o quarto de Diogo. Sentei na cama e vi Alice suspirar aliviada ao me ver acordado.
- Você me deu um susto! - ela disse, me abraçando. - Não pode sair desmaiando sempre que vê sangue...
- Você sabe que tenho medo...
- Eu cortei sem querer o dedo, mas foi uma coisinha de nada.
- Cadê? - perguntei, pegando suas mãos. Logo vi uma ferida, ainda escarlate. Não senti tonturas, nem vontade de vomitar, tampouco me paralisou.
- Você não tem mais medo? - ela indagou, franzindo a testa.
- Acho que não... - respondi confusamente.
- Isso é bom... Aliás, quando cheguei no quarto vi um coelho. Por que não me contou que tinha um?
- Como assim?
- Aqui. - ela pegou um coelho branco, lindo e gorducho do chão e colocou em meu colo.
- Er... Achei que tinha contado... - inventei uma desculpa.

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