É incrível quando toda sua vida passa por seus olhos, e foi o que aconteceu naquele momento.
Dei passos para trás, mesmo que minhas pernas estivessem bambas eu consegui me mexer.
- O TACO! - gritou Sheldon.
Então lembrei que tinha um bastão de beisibol em mãos e o preparei para me defender, canalizei todo o medo transformando-o em força para proteger a mim e a meu cachorro.
O cadáver continuava andando na nossa direção, e eu finalmente tomei coragem para direcionar o taco nele.
- VAI! - gritou o lobisomem, me assustando.
Com o susto, rebati no tronco do cadáver, que voou longe. Corri até ele, rebatendo em sua cabeça que deslocou-se do corpo. De seu pescoço, saíram larvas e baratas, afastei-me delas o mais rápido possível, mas uma coisa agarrou minha perna: era a corrente.
Mesmo sem a cabeça, o corpo continuava a se mexer. Um dos braços puxava a corrente enroscada em meu calcanhar, e eu fazia de tudo para me soltar e não cair.
Mais à frente, Sheldon rosnou e correu para me ajudar. Eu enfim caí no chão duro, batendo meu queixo.
Senti o aperto no calcanhar se afrouxando, e meu cachorro logo veio ao meu campo de visão mostrando a corrente em sua boca.
- Corra! - disse, indo rápido para a outra porta.
Levantei-me e corri para pegar a máscara e adentrei a última porta seguido de Sheldon.
Mal recuperei minha respiração e já dei de cara com o quarto que procurava...
O corredor era muito mal iluminado, a única fonte de luz era uma janelinha no canto. Em cada parede havia espelhos, um seguido do outro, para onde eu olhasse havia reflexos.
Olhei então para o fim do corredor, um único e gigantesco espelho refletia a minha figura e a de Sheldon...
- AAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH! - um grito quase me ensurdece. Procurei sua origem, quando olhei de volta para o espelho da frente, lá estava ela, um fantasma branco como papel, cabelos negros, lisos e compridos, olhos esbugalhados mas sem nada nas órbitas e uma boca escancarada.
- DESTRUA OS ESPELHOS! - gritou Sheldon.
Coloquei a máscara e destrui o primeiro com o taco, uma demanda de cacos de vidro vieram da frente. Corri para o outro lado, quebrei mais um, mais outro e mais outro, eu já possuía vários cortes na pele. O que percebi de relance era que saía uma espécie de gás quando os quebrava, mas não dei muita importância,continuei quebrando-os de forma louca.
- MUAHAHAHAHAHA - um riso demoníaco preencheu o quarto, fazendo-me relutar um pouco, já que não faltava muito para chegar ao reflexo do fantasma.
Desviei de uma demanda de cacos de vidro sem tanto sucesso e quebrei o último...
- USE A ADAGA! - meu cachorro berrou para mim.
Aquele fantasma... tinha um sorriso tão diabólico nos "lábios" negros que eu receei em fazê-lo.
Peguei a faca, esfaqueando o reflexo.
Acho que o tal espírito achou que eu não conseguiria ou algo do tipo, pois olhou para onde eu tinha acertado - e para minha surpresa, aquilo não era um espelho, era um portal - com uma expressão de incredulidade.
Então a superfície começou a se despedaçar em grandes fragmentos, e eu tirei a faca de dois gumes do ponto esfaqueado.
Afastei-me um pouco, esperando os cacos caírem e a imagem do fantasma se dissipar.
Sheldon aproximou-se de mim e latiu.
- Isto leva para um novo cômodo. - falou.
- Hm? - indaguei.
- Olhe para frente.
Obedeci, e percebi que enquanto fitava meu cachorro o tal "espelho" havia caído por completo e revelava um novo quarto. Mas... havia uma criança lá dentro.
Atravessei a moldura do antes espelho com cautela, o ser ali presente parecia assustado, agachado e abraçando os joelhos.
Mantive uma pouca distância, agachando-me e tentando parecer menos ameaçador possível, tirei a máscara para isso.
A criancinha parecia com todas as figuras anteriores, mas com o rostinho humano e inofensivo. Seus olhos eram negros, infantis e inocentes, parecia uma criança qualquer a não ser pela sua palidez anormal.
- Obrigada... - disse ela, com uma voz doce e suave.
- Pelo quê?
- Você me libertou, senhor. - sorriu levemente.
- Quem te matou?
- Minha babá...
Sheldon se aproximou, fungando perto dela.
- O que ela te fez?
- Ela me estrangulou... meus pais tinham saído... acho que eu fui uma menina má...
- Não diga isso. Há pessoas muito más nesse mundo, você é só uma criança.
- ... - retorceu a boca numa careta engraçada. - Logo que morri eu a matei do mesmo jeito que fez comigo... e a aprisionei num espelho... depois foram meus pais, eu queria eles perto de mim, mas não estava em paz, faltava algo... Então fiquei com raiva....
- E matou todas as outras pessoas que tentaram vir morar aqui. - completei cautelosamente.
- Eu não queria outras pessoas invadindo minha casa.
- Tudo bem, tudo bem, entendemos. - acariciei seu cabelo com cuidado. Eram macios, gostosos de pegar.
- Eu estou em paz agora, e devo deixar a casa daqui a pouco. Faz um favor pra mim?
- Claro.
- Ajeita esse casarão? Quero que ele esteja bem bonito para receber novos moradores.
- Okay. Eu e Sheldon cuidaremos disso. - recolhi minha mão.
Ela sorriu e se levantou, caminhando para o outro lado do cômodo, desaparecendo no ar.
Eu saí da casa com vários cortes, mas um sentimento de valentia e dever cumprido no peito compensava o esforço. Trazia comigo as duas cartas, a corrente, o taco de beisibol, as luvas e a máscara como lembrança, mas o que eu mais queria era deitar na minha cama e ler.
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